Michel Foucault já sabia, aquilo não era um cachimbo, mas uma idéia de sua cabeça. Primeiro olhou a pintura, parecia bem óbvio que aquilo não era um cachimbo, uma figura bidimensional pintada com tinta em uma tela, estava longe do conceito de cachimbo. Depois olhou para o cachimbo na mesa, que também era de madeira, e se perguntou quando a madeira de alguma árvore deixou de ser simplesmente madeira e se tornou mesa, ou cachimbo. Filosofando sobre o Não-ser e vir-a-ser não desvendou o verdadeiro mistério, nem mesmo a porta de entrada para ele. Essa porta se chama realidade.
Tente explicar para uma criança que ela não precisa ter medo do escuro porque monstros não existem. Qual justificativa você iria usar? Provaria empiricamente que não há criatura nenhuma no lugar, ou retomaria as explicações tradicionais de que aquilo era é apenas imaginação e que não devemos confiar em nossa imaginação? Caso tenha identificado a solução anteriormente você provou exatamente o contrário, o monstro existe e ele é você.
A criança sabe o que o monstro é real, ele está com medo dele, não precisa ver ou tocar, a sua realidade transmite fisica (dispneia e taquicardia) e psicologicamente (escutar ou ver a criatura) que o monstro está ali. Não importa o que você diga você não poderá mudar a realidade da criança, pelo menos não a mantendo livre.
Você, que acha que a realidade é uma coisa externa aos homens e deuses, não passa de uma criança no escuro com medo de um monstro. Você aceitaria se alguém dissesse que a crise econômica não existe? Mesmo provando que tudo o que aconteceu já estava previsto, que o não pagamento das casas, a especulação imobiliária, e todo o resto apontavam para um só destino lógico, descaracterizando a crise em si e transformando seu prejuízo em piada? A crise é real para você, você sente, imagina e por isso cria a realidade da crise, mesmo existindo bilionários que só ouviram a notícia da e países subdesenvolvidos que não tiveram crise, mas um superavit e têm sua realidade transformada de uma maneira positiva.
Porque os sonhos não são ditos reais? Talvez por suas conseqüências não serem óbvias, essa é a única explicação. Você leva um tiro na perna em um sonho, ao acordar, sua perna parece saudável, mas a dor latente que sentira a pouco tira o sentido da lógica vivente, aquela incontestável. Nada é incontestável. Mas somos ensinados a escolher, ou uma ou outra é real, nunca as duas, nunca o sonho, nunca a imaginação que foi podada por aquele que pode ser desafiado por ela.
A verdadeira prisão de intelecto é o aprendizado de realidades, as idéias. Nossas realidades são ensinadas como crenças e tradições fixas, que devem ser aceitas e empregadas na nossa vida como correto, fácil ou funcional. Os caminhos já estão traçados, e por isso são previsíveis, tanto o caminho do sucesso, da dignidade, como o da marginalidade e do desprezo. Basta um passo, um deslize, um chute de sorte e pronto, sua história está traçada, pois foi assim que sempre aconteceu e acontecerá. Nossas decisões são reações em cadeia, você escolhe o começo e o final de uma só vez. Um efeito borboleta que não precisa nem dar a volta ao mundo, retroalimentada pelos que olham a realidade passar e possui asas tão fortes que provoca um tufão a centímetros de distância, sem precisar de influência alguma.
O real é um deserto, esperando pra ser transformado e povoado por nossas idéias. Se um objeto tão concreto como um cachimbo; que possui volume, massa e uma série de características que seus sentidos percebem, não é real, é só uma idéia ensinada e mecânica, tente imaginar o que é o Amor, a Ira, o Desespero, a Morte, a Felicidade.
Imagine o que é DEUS.
Take the Red Pill
Nós somos agentes da realidade, não ficamos esperando ela passar. O mundo não é o que é, o que as idéias milenares transmitem, o mundo não é o tradicional. O mundo não É.
Basta uma escolha (como se fosse simples), para realmente entender. Não é fácil possuir a uma coisa tão valiosa como vontade. Precisamos querer para conseguir transpassar as linhas do que é real, perceber de uma só vez todas as realidades, não negar nenhuma, transformar e alimentar o seu conhecimento com cada uma delas.
Diferentemente do que Morpheus fala para convencer Neo a tomar a pílula vermelha, ao tomá-la você não vai ver a verdade, pelo contrário, a verdade será destruída, não só ela, todas as verdades não serão mais verdades. A educação aristotélica de que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa será destruída, só existirá umacoisaoutracoisa. Quem acha que sabe o que é dor nunca teve o seu conhecimento expandido desse jeito, suas crenças, idéias, ideologias e verdades desmoronando, e uma tsunami de novas perspectivas, noções e realidades. Dói como nenhuma dor física ou psicológica, é uma dor na sua existência, na sua essência.
Além disso, todos nós sabemos o que é o conforto das verdades ilusórias, a ignorância perpétua, a entidade que podemos ver ao ligar a TV ou entrar na internet, das conversas de esquina até as pós-graduações e doutorados mais renomados. A verdade premeditada e sem preocupações e responsabilidades, o cruzeiro luxuoso indo a favor da maré. O não-filé que está no seu prato tem gosto de filé, tem cheiro de filé e ainda mata a fome, quem irá se distanciar disso para conhecer todas as sensações? Sensações agradáveis ou não, na verdade na maioria não. Somos taxados de loucos por querer conhecer, seguir o coelho correndo com o relógio nas mãos. A curiosidade mata, mas dá vida a tudo que existe.
As pílulas são muito difíceis de encontrar, e cada um só é capaz de reconhecer a sua própria pílula, mesmo assim vocês não podem desistir, a busca por ela já é um ensinamento, uma luz na escuridão. É um caminho sem volta, você morre e renasce um deus, o mundo não será o mesmo, e a realidade não mais existirá. Você terá todos os olhos e todas as distâncias disponíveis para olhar o tudo. Um olhar sem medir distância vê tudo e todos.
Nós deuses somos verdade pura, tudo em um só, todas as realidades. Voar é só uma questão de vontade, não existem barreiras, os truques físicos são mera ilusão de ótica. Os verdadeiros superpoderes são o de controlar as emoções; transformar vontades; sentir tudo ao mesmo tempo; ou sentir nada; conhecer a história e a origem de cada verdade; ter as melhores respostas da vida e infinitas perguntas.
A verdade é apenas um exército no horizonte, e ele recua na medida em que avançamos.
Até a próxima, o coelho já passou e eu estou atrasado.